O tempo, a história, os acontecimentos, os problemas, as crises, a (sobre)vivência dão-nos um tesouro, uma sabedoria que é simplesmente impagável.
Numa época em que se atiram os velhos (e as crianças) para a zona escura ou escondida da sociedade, pensar na "herança" é muito importante. Numa época em que as marcas escolhem miúdas acabadas de sair da adolescência para publicitar cremes "miraculosos" para as rugas é importante parar para pensar com a cabeça sobre este tema. Eu sou optimista e penso sempre que o mais racional e lógico é amar a nossa condição actual e aprender a gostar dela. Por isso, acho sempre que a melhor idade é aquela em que eu estou. E efectivamente estou profundamente convencida disso: aceitar a idade é condição de elegância porque só partindo da realidade é que conseguimos demonstrar com verdade aquilo que somos. Isso, para mim, é condição da elegância.
Hoje a maior faixa "de mercado" são as mulheres de 50 anos e isso dá-lhes um estatuto único e um enorme poder. Isto faz-me pensar no discurso da Patricia Arquette quando ganhou o Óscar e nos imensos anos da minha vida profissional em que fui olhada com uns olhos não-profissionais pelos homens (e algumas mulheres) que fizeram com que eu tivesse de ter dado provas que não foram exigidas aos homens e ter trabalhado mais do que os homens para dar provas, me impor como profissional numa área de "fatos de terylene" cinzentos-claro (que eu odeio) e para que olhassem para mim enquanto profissional e não como "mulher de trapos". Mas isso são outras histórias que não são para aqui chamadas.
Hoje vou contar duas histórias muito interessantes sobre "heritage". Um tem a ver com a Oliver Goldsmith e outra com a Gucci.
Antes da Oliver Goldsmith os óculos eram todos de metal. A Oliver Goldsmith tinha em frente uma fábrica de botões. Então, um dia, lembraram-se de ir à fábrica de botões e pediram-lhes que fizessem umas placas para fazer óculos. Parece que nesse dia fizeram cem óculos com este material inovador para a época. E parece que os cem óculos se venderam numa hora. A partir da Oliver Goldmisth a história dos óculos nunca mais foi a mesma. Hoje todos os óculos desta marca têm o ano da sua criação na haste, do lado de dentro (não têm a marca por fora, como eu gosto). Talvez os mais icónicos sejam os usados pela Audrey Hepburn ou a Grace Kelly. Uma curiosidade é que estes óculos são feitos exactamente da mesma forma que o eram em 1960 ou 1959 ou 1971! Ter nas mãos uns óculos assim é uma aventura! Estão cheios de história e de histórias para contar!!!!
Outra história tem a ver com as pegas de bambu nas carteiras da Gucci. No tempo da guerra e nos pós guerra, os bens eram racionados e não havia couro. Itália foi muito afectada com a guerra e, em 1947, pela falta de couro, os criadores da Gucci resolveram fazer a pega da carteira em bambu. Hoje em dia a "bamboo bag" é um ícone que inspira milhares de outras marcas (e imitações...), incluindo bijutaria. A forma do bambu passou para outras coisas e é conhecida nos relógios e nas argolas da Gucci. Mas tudo começou numa época de enormes dificuldades.
Eu lembro-me sempre desta história nos tempos de crise e concluo que muitas coisas boas podem resultar de épocas menos boas, seja da história, seja das nossas vidas!
Estas fotografias são do século passado, mas têm alguma coisa de "intemporal"